07/06/2015
É indescritível o ato de adotar. É indescritível ser capaz de aceitar (o outro como ele é) e renunciar (a tantos conceitos e condições) ao mesmo tempo, quando se pratica a adoção. É indescritível a capacidade de ser capaz de adotar.
Bem por isso que a adoção não é a regra, mas sim a exceção.
A Constituição Federal de 1988, nos artigos 226 e 227 definiu que “A FAMÍLIA, BASE DA SOCIEDADE, TEM ESPECIAL PROTEÇÃO DO ESTADO” e que é “DEVER DA FAMÍLIA, DA SOCIEDADE E DO ESTADO ASSEGURAR À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE, COM ABSOLUTA PRIORIDADE, O DIREITO À VIDA, À SAÚDE, À ALIMENTAÇÃO, À EDUCAÇÃO, AO LAZER, À PROFISSIONALIZAÇÃO, À CULTURA, À DIGNIDADE, AO RESPEITO, À LIBERDADE E À CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA, ALÉM DE COLOCÁ-LA A SALVO DE TODA FORMA DE NEGLIGÊNCIA, DISCRIMINAÇÃO, EXPLORAÇÃO, VIOLÊNCIA, CRUELDADE E OPRESSÃO.”
A partir desses princípios veio o Estatuto da Criança e do Adolescente, pelo artigo 19, declarar que “TODA CRIANÇA OU ADOLESCENTE TEM DIREITO A SER CRIADO E EDUCADO NO SEIO DE SUA FAMÍLIA E, EXCEPCIONALMENTE, EM FAMÍLIA SUBSTITUTA, ASSEGURADA A CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA, EM AMBIENTE LIVRE DA PRESENÇA DE PESSOAS DEPENDENTES DE SUBSTÂNCIAS ENTORPECENTES.”
No entanto, ressalvados todos aqueles que alcançaram essa sublime capacidade de se dispor à adoção, tem-se visto que, para alguns e pelo comportamento de alguns, esta, a adoção, corre o risco de se tornar “regra” e a convivência da criança com sua mãe biológica e seu pai, a exceção.
Entretanto, partindo-se do princípio que a adoção é um ato de amor, conclui-se que o alvo desse amor, que é a criança, é que é o senhor de todo o direito, é o destinatário final de todo esforço, de toda vontade, de toda bondade, de todo respeito, de toda consideração, de todas as regras, normas e ordenamentos. Ela é o centro de tudo.
Todavia, ao inverter-se a ordem dos fatores, colocando a permanência na família natural como exceção e a adoção como regra, tiramos a criança desse centro, porque tiramos dela seu primeiro direito: de ter sua mãe, de ser criada por sua mãe.
Para a criança não interessa que a mãe seja pobre ou prostituta. Para a criança aquela mulher é “a mãe”. E a maternidade é o primeiro direito que qualquer criança tem, simultaneamente ao direito à vida.
O que ocorre, todavia, é que a pobreza tem motivado uma grande mudança social, na medida em que mães e pais estão perdendo o poder familiar por força de decisões judiciais que deles tiram a maternidade e a paternidade, como solução para a vida daquela criança.
Ouso dizer que não é.
A solução é promover a mãe e o pai, a família. Aliás, prioridades declaradas constitucionalmente.
O entendimento da sociedade, contudo, tem se acomodado na confortável situação de promover a exceção. Essa medida pode ser a solução para o adotante, que então terá como por em prática sua sublime condição de um ser preparado para o ato, superando todos os seus conceitos e limitações e aceitando o filho de outra na sua família, e também por preencher sua vida com um filho que naturalmente não pode ou não quis ter.
Mas, onde fica a prioridade ao direito daquela criança ter sua mãe? Ser cuidada por sua mãe? Ser criada por sua mãe? Em que parte da história fica aquele amor incondicional que o adotante declara pelo pretenso adotado?
Então, adotar é sublime, mas em alguns casos também representa a segunda violação ao direito daquela criança que está sendo adotada: dela estão tirando sua mãe biológica, que em 99% dos casos vai perder o poder familiar em conseqüência de sua condição miserável, não obstante também a lei determinar (art. 23 do ECA) que A FALTA OU A CARÊNCIA DE RECURSOS MATERIAIS NÃO CONSTITUI MOTIVO SUFICIENTE PARA A PERDA OU A SUSPENSÃO DO PÁTRIO PODER.
Ao que parece não temos uma clara compreensão do que seja prioridade e de que a pobreza não é escolha de vida, mas circunstância.
O direito primário daquela criança está sendo, assim, violado inclusive pelo próprio Estado, na medida em que não se está exigindo o cumprimento do que dita o artigo 19 do ECA à luz dos artigos 226 e 227 da C.F.
Precisamos enfrentar essas questões, pois também é da Constituição Federal desta República (ART. 6º) que “SÃO DIREITOS SOCIAIS A EDUCAÇÃO, A SAÚDE, O TRABALHO, A MORADIA, O LAZER, A SEGURANÇA, A PREVIDÊNCIA SOCIAL, A PROTEÇÃO À MATERNIDADE E À INFÂNCIA, A ASSISTÊNCIA AOS DESAMPARADOS, NA FORMA DESTA CONSTITUIÇÃO.”
Tão sublime é a adoção, mas divina é a maternidade. E em nome disso, do amor que declaramos ter pelas crianças, cabe nosso esforço para, simultaneamente ao movimento pela adoção, investir na recuperação da família; exigir do Estado, através dos Poderes Constituídos, a destruição da pobreza e da miséria e garantir a cada criança seus mais primários direitos: A VIDA E A SUA MÃE.
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